Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinho. Há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas!
10-12-2019
A palavra “graça” tem muitos significados. Pode significar “encanto”, quando dizemos: “Ela movimenta-se pela sala com graça”. Pode significar “benevolência”, se dizemos: “É uma graça que espero alcançar na sua bondade”. Pode significar “agradecimento”, como na “ação de graças” das refeições. E ainda se podem acrescentar meia dúzia mais de exemplos em que se usa habitualmente a palavra “graça”.
Na ciência teológica, porém, graça tem um significado muito estrito e definido. Antes de mais nada, designa um dom de Deus. Não qualquer tipo de bom, mas um que é muito especial. A própria vida é um dom divino. Para começar, Deus não tinha obrigação de criar a humanidade e muito menos de criar-nos a você e a mim como indivíduos. E tudo o que acompanha a vida é também dom de Deus. O poder de ver e falar, a saúde, os talentos que possamos ter – cantar, desenhar ou cozinhar um prato -, absolutamente tudo é dom de Deus. Mas são dons chamados naturais. Fazem parte da nossa natureza humana. Existem certas qualidade que têm acompanhar necessariamente uma criatura humana, tal como Deus a designou. E propriamente não se podem chamar graças.
Em teologia, reserva-se a palavra “graça” para descrever os dons a que o homem não tem direito, nem sequer remotamente, dons a que a sua natureza humana não lhe dá acesso. Usa-se para nomear os dons que estão “sobre” a natureza humana. Por isso dizemos que a graça é um dom sobrenatural de Deus.
Mas a definição ainda está incompleta. Há dons de Deus que são sobrenaturais, mas, em sentido estrito, não se podem chamar graças. Por exemplo, uma pessoa com câncer incurável pode curar-se milagrosamente em Lourdes. Neste caso, a saúde dessa pessoa será uma dom sobrenatural, pois foi-lhe restituída por meios que ultrapassam a natureza. Mas, se quisermos falar com precisão, essa cura não é uma graça. Há também outros dons que, sendo sobrenaturais na sua origem, não podem ser qualificados como graças. Por exemplo, a Sagrada Escritura, a Igreja ou os sacramentos são dons sobrenaturais de Deus. Mas este tipo de dons, por sobrenaturais que sejam, atuam fora de nós. Não seria incorreto chamá-los “graças externas”. A palavra “graça”, porém, quando utilizada em sentido simples e por si, refere-se àqueles dons invisíveis que residem e operam na alma. Assim, precisando um pouco mais a nossa definição, diremos que graça é um dom sobrenatural e interior de Deus.
Mas isto levanta-nos imediatamente outra questão. Às vezes, Deus dá a alguns eleitos o poder de predizer o futuro. É um dom sobrenatural e interior. Chamaremos graça ao dom de profecia? Mais ainda, um sacerdote tem o poder de mudar o pão e o vinho no corpo e no sangue de Cristo e de perdoar os pecados. São, certamente, dons sobrenaturais e interiores. Serão graças? A resposta é “não” a ambas as perguntas. Estes poderes, ainda que sejam sobrenaturais e interiores, são dados para beneficio de outros, não daquele que os possui. O poder que tem um sacerdote de oferecer a missa não lhe foi dado para si mesmo, mas para o Corpo Místico de Cristo. Um sacerdote pode estar em pecado mortal, e no entanto a sua missa será válida e obterá graças para os outros. Pode estar em pecado mortal, mas as suas palavras de absolvição perdoarão aos outros os seus pecados. Isto leva-nos a acrescentar outro elemento à nossa definição de graça: é um dom sobrenatural e interior de Deus, concedido para a nossa própria salvação.
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O Prof. Pe. José Vergílio é palestrante em várias áreas de sua competência de formação profissional que abrangem os campos da Teologia Sistemática, Psicologia Social, Análise Conjuntural, Filosofia, Contextos Geopolíticos, Mobilidade humano e Sustentabilidade Planetária.
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